Vatican News - Mariangela Jaguraba
Na catequese da Audiência Geral, desta quarta-feira (05/04),
realizada na Praça de São Pedro, o Papa Francisco recordou que no Domingo
de Ramos, ouvimos a liturgia da Paixão do Senhor que termina com as
seguintes palavras: «Selaram a pedra».
"Tudo parece ter acabado. Para os discípulos de Jesus, aquela pedra marca o fim da esperança",
frisou o Papa. "O Mestre foi crucificado, morto da maneira mais cruel e
humilhante, pendurado num patíbulo infame fora da cidade: um fracasso
público, o pior final possível".
Pois bem, aquele desânimo que oprimia os discípulos não nos é
totalmente estranho hoje. Também em nós adensam-se pensamentos obscuros e
sentimentos de frustração: por que tanta indiferença em relação a Deus?
Por que tanto mal no mundo? Por que as desigualdades continuam
a aumentar e não chega a paz tão almejada? Por que somos tão apegados à
guerra, a fazer o mal uns aos outros? No coração de cada um, quantas
expetativas desvanecidas, quantas desilusões! E ainda aquela sensação
de que os tempos passados eram melhores e de que no mundo, talvez até na
Igreja, as coisas não são como outrora. Em síntese, também hoje a
esperança parece às vezes selada sob a pedra da desconfiança.
"Na mente dos discípulos permanecia fixa uma imagem: a cruz.
Ali estava concentrado o fim de tudo. Mas pouco tempo depois
descobririam na própria cruz um novo início. Do mais terrível
instrumento de tortura, Deus obteve o maior sinal do amor. Aquele
madeiro de morte, transformado em árvore de vida, lembra-nos que os
inícios de Deus começam muitas vezes a partir dos nossos fins: é assim
que Ele gosta de fazer maravilhas", sublinhou Francisco.
A seguir, o Papa convidou a olhar "para a árvore da cruz, para que em nós brote a esperança:
aquela virtude quotidiana, aquela virtude silenciosa, humilde, mas
aquela virtude que nos mantém de pé, que nos ajuda a ir em frente. Sem
esperança não se pode viver. Pensamos: onde está a minha esperança?
Hoje, olhemos para a árvore da cruz para que brote em nós a esperança:
para sermos curados da tristeza – mas, quantas pessoas tristes".
"Quando eu podia caminhar pelas ruas, agora não posso porque não me
deixam, gostava de observar o olhar das pessoas. Quantos olhares
tristes! Pessoas tristes, pessoas que falavam sozinhas, gente que andava
só com o telemóvel, mas sem paz, sem esperança. E onde está hoje a sua esperança? É preciso um pouco de esperança, hein? Para sermos curados da
tristeza que nos adoece: há tanta tristeza; para sermos curados da
amargura com que poluímos a Igreja e o mundo", disse ainda o Papa.
Olhando para o Crucifixo, vemos "Jesus despojado, ferido, Jesus atormentado. É o fim de tudo? Ali há esperança", sublinhou o Pontífice, acrescentando:
Com efeito, nós temos dificuldade em despojarmo-nos, em fazer a
verdade; revestimo-nos de exterioridade, que procuramos e cuidamos, de
máscaras para nos disfarçarmos e nos mostrarmos melhores do que somos.
Pensamos que o importante é ostentar, de tal modo que os outros falem
bem de nós. E adornamo-nos de aparências, de coisas supérfluas; mas
assim não encontramos a paz. Depois, a maquilhagem vai embora
olhas-te no espelho com aquela cara feia que tens, mas verdadeira,
aquela que Deus ama, não a maquilhada, não. Jesus despojado de tudo
lembra-nos que a esperança renasce fazendo a verdade sobre nós mesmos, dizer
a verdade a ti mesmo, abandonando as ambiguidades, libertando-nos da
convivência pacífica com as nossas falsidades. Às vezes, estamos tão
acostumados a dizer falsidades a nós mesmos que convivemos com elas como
se fossem verdades e acabamos envenenados pelas nossas falsidades.
Segundo Francisco, "é necessário regressar ao coração, ao essencial, a
uma vida simples, despojada de tantas coisas inúteis, que substituem a
esperança". A seguir, o Papa disse que nesta Semana Santa é bom olhar para o nosso guarda-roupa despojarmo-nos das coisas que temos, que não
usamos, coisas muitas vezes "coisas desnecessárias". "Nós também temos
tantas coisas inúteis dentro do nossos corações – e fora também. Olha para o teu guarda-roupa: olha para ele. Isto é útil, aquilo é inútil, e
faz uma limpeza. Olha para o guarda-roupa da alma: quantas coisas
inúteis tens, quantas ilusões estúpidas. Voltemos à simplicidade, às
coisas reais que não precisam de maqulhagem. Aqui está um bom
exercício", disse o Papa.
Olhemos agora pa Jesus ferido. "A cruz mostra os pregos que lhe
furam as mãos e os pés, o lado aberto. Mas váriass feridas do corpo
acrescentam-se as da alma. Jesus está sozinho: traído, entregue e
renegado pelos seus, condenado pelo poder religioso e civil, experimenta
até o abandono de Deus."
"Também nós estamos feridos: quem não o está na vida? Quem não
carrega as cicatrizes de escolhas passadas, de incompreensões, de dores
que permanecem dentro e são difíceis de superar? Mas também de
injustiças sofridas, de palavras cortantes, de juízos inclementes?",
perguntou Francisco. "Deus não esconde aos nossos olhos as feridas que
lhe trespassaram o corpo e a alma. Mostra-as para nos indicar que na
Páscoa pode-se abrir uma nova passagem: fazer das próprias feridas furos de luz.
Como Jesus, que na cruz não recrimina, mas ama. Ama e perdoa quantos o
ferem. Assim converte o mal em bem, assim transforma a dor em amor",
sublinhou.
Irmãos e irmãs, a questão não é ser ferido pouco ou muito pela
vida, mas a questão é o que fazer com estas feridas. Posso deixá-las
infetar no rancor e na tristeza, ou posso uni-las às de Jesus, a fim de
que também as minhas chagas se tornem luminosas. Pensem em quantos
jovens, quantos jovens, quantos jovens, que não toleram as suas feridas e
procuram no suicídio uma via de salvação: hoje, nos nossas cidades,
muitos, muitos jovens que não veem saída, que não têm esperança e
preferem ir em frente com as drogas, com o esquecimento... coitados!
Pensem nisto. E tu, qual é a tua droga, para cobrir as feridas? As
nossas feridas podem tornar-se fontes de esperança quando, em vez de nos
comiserarmos, enxugamos as lágrimas dos outros; quando, em vez de ter
ressentimento pelo que nos é tirado, cuidamos do que falta aos outros;
quando, em vez de nos inquietarmos, nos debruçamos sobre quantos sofrem;
quando, em vez de ter sede de amor por nós próprios, saciamos a sede de
quem precisa de nós.
Segundo o Papa, "só nos reencontraremos, se deixarmos de pensar em
nós mesmos. E é agindo assim - diz a Escritura - que a nossa ferida em
breve cicatrizará, e a esperança voltará a florescer. Pensem: O que
posso fazer pelos outros? Eu estou ferido. Estou ferido pelo pecado,
estou ferido pela história, cada um tem a sua ferida. O que eu faço:
lambo minhas feridas assim, a vida toda? Ou olho para as feridas dos
outros e vou com a experiência ferida da minha vida, curar, ajudar os
outros?" "Este é o desafio de hoje, para todos vós, para cada um de
vós, para cada um de nós. Que o Senhor nos ajude a seguir em frente",
concluiu.