domingo, 25 de julho de 2021

Francisco: acredita no amor, no poder do serviço, na força da gratuidade

 
 O Papa Francisco durante o Angelus deste Domingo 
 
"A lógica do dom é muito diferente da nossa. Nós buscamos acumular e aumentar o que temos. Em vez disso, Jesus nos pede para doar, para diminuir. Nós amamos acrescentar, gostamos de adicionar. Jesus gosta de subtrair, de tirar alguma coisa para dar aos outros", disse o Papa no Angelus.
 

Mariangela Jaguraba - Vatican News

O Papa Francisco rezou a oração mariana do Angelus, deste domingo (25/07), da janela do apartamento pontifício, com os fiéis e peregrinos reunidos na Praça de S. Pedro.

Na alocução que precedeu a oração, Francisco recordou o Evangelho da Liturgia deste domingo que narra o famoso episódio da multiplicação dos pães e peixes, com o qual Jesus alimentou cerca de cinco mil pessoas que foram ouvi-lo.

Segundo o Papa, "é interessante ver como acontece este milagre: Jesus não cria os pães e os peixes do nada, mas age a partir do que os discípulos lhe trazem. Um deles diz: "Há aqui um menino que tem cinco pães de cevada e dois peixes; mas o que é isto para tanta gente"? "É pouco, não é nada, mas é o suficiente para Jesus", disse o Pontífice.

Um grande ensinamento para nós

"Vamos agora tentar olocar-nos no lugar daquele menino", disse Francisco, acrescentando:

Os discípulos pedem-lhe para partilhar tudo o que ele tem para comer. Parece uma proposta insensata, aliás, injusta. Porque privar uma pessoa, principalmente um menino, do que ele trouxe de casa e tem o direito de guardar para si? Porque tirar de uma pessoa o que não é suficiente para alimentar todos? Humanamente, é ilógico. Mas não para Deus. Pelo contrário, graças a esse pequeno dom gratuito e, portanto, heróico, Jesus pode alimentar todos. Este é um grande ensinamento para nós. Ele diz-nos que o Senhor pode fazer muito com o pouco que colocamos à sua disposição.

A seguir, o Papa disse que seria bom interrogar-nos todos os dias: "O que levo eu para Jesus, hoje?" "Ele pode fazer muito com uma oração nossa, com um gesto de caridade para com os outros, até mesmo com a nossa miséria entregue à sua misericórdia. Deus ama agir assim: Ele faz grandes coisas a partir de coisas pequenas e gratuitas", sublinhou.

Jesus pede-nos para doar, para diminuir

A seguir, Francisco recordou que todos os grandes protagonistas da Bíblia, de Abraão a Maria, e também o menino citado no Evangelho de hoje, mostram esta lógica da pequenez e do dom.

A lógica do dom é muito diferente da nossa. Nós procuramos acumular e aumentar o que temos. Em vez disto, Jesus pede-nos para doar, para diminuir. Nós amamos acrescentar, gostamos de adicionar. Jesus gosta de subtrair, de tirar alguma coisa para dar aos outros. Nós queremos multiplicar para nós. Jesus aprecia quando dividimos com os outros, quando partilhamos. É curioso que nos relatos da multiplicação dos pães presentes nos Evangelhos, o verbo "multiplicar" nunca aparece. Pelo contrário, os verbos usados são de sinal oposto: "partir", "dar", "distribuir". O verdadeiro milagre, diz Jesus, não é a multiplicação que produz glória e poder, mas a divisão, a partilha, que aumenta o amor e permite que Deus realize maravilhas. Vamos compartilhar mais: experimentar este caminho  Jesus ensina-nos.

Fome que afeta particularmente as crianças

Francisco recordou que "também hoje, a multiplicação de bens não resolve os problemas sem uma partilha justa".

Vem à mente a tragédia da fome que afeta particularmente as crianças. Foi calculado que todos os dias no mundo cerca de sete mil crianças abaixo de cinco anos morrem devido à desnutrição. Porque não têm o necessário para viver. Diante de escândalos como estes, Jesus também nos faz um convite, um convite semelhante ao que provavelmente recebeu o menino do Evangelho, que não tem nome e no qual todos nós podemos ver: "Coragem, doa o pouco que tem, os teus talentos e os teus bens, coloca-os à disposição de Jesus e dos irmãos. Não tenhas medo, nada será perdido, porque se partilhas, Deus multiplica. Expulsa a falsa modéstia de te sentires inadequado, confia Acredita no amor, no poder do serviço, na força da gratuidade.

O Papa concluiu a sua alocução, pedindo "que a Virgem Maria, que respondeu "sim" à proposta inaudita de Deus, nos ajude a abrir o coração para os convites do Senhor e para as necessidades dos outros".

VN

domingo, 18 de julho de 2021

Papa: descanso, contemplação e compaixão para uma "ecologia do coração"

 
 
Na sua alocução neste domingo, antes de rezar o Angelus, o Papa Francisco falou sobre a importância do verdadeiro repouso: "parar, ficar em silêncio, rezar, para não passar das coisas do trabalho para as férias", pois somente "o coração que não se deixa levar pela pressa é capaz de se comover (...), de perceber os outros, as suas feridas, as suas necessidades. A compaixão nasce da contemplação"
 

Jackson Erpen - Cidade do Vaticano

Descanso e compaixão, dois aspetos importantes da vida que guiaram a reflexão do Papa Francisco no Angelus deste XVI Domingo do Tempo Comum, que voltou a ser rezado da janela do apartamento pontifício, visto que o anterior foi do Hospital Agostino Gemelli, onde o Pontífice recuperava de uma cirurgia.

O perigo do ativismo

O Papa inspirou-se no Evangelho de Marcos proposto pela liturgia do dia para chamar à atenção que Jesus se preocupa com o cansaço físico e interior dos seus discípulos. Prova disto, é que ao ouvir os seus relatos jubilosos pelos “prodígios da pregação” durante a missão, Jesus faz-lhes um convite: “Vinde sozinhos para um lugar deserto e descansai um pouco”, convida ao repouso.

Ele quer alertá-los para um perigo, que está sempre à espreita também para nós: o perigo de deixar-mo-nos cair no frenesim do fazer, cair na armadilha do ativismo, onde o mais importante são os resultados que obtemos e o sentir-mo-nos protagonistas absolutos.

Aprender a parar

E isso, observou Francisco, acontece também na Igreja, “estamos atarefados, corremos, pensamos que tudo depende de nós e, no final, corremos o risco de negligenciar Jesus e estarmos sempre nós no centro. Por isso, convida os seus para repousar um pouco à parte, com Ele”:

Não é apenas repouso físico, é também descanso do coração. Porque não basta “desligar”, é preciso repousar de verdade. E como se faz isto? Para fazer isto é preciso voltar ao cerne das coisas: parar, ficar em silêncio, rezar, para não passar da correria do trabalho para a correria das férias.

Mas o facto de Jesus se retirar em cada dia na “oração, no silêncio, na intimidade com o Pai”, não impede que Ele esteja atento às necessidades da multidão, e o convite dirigido aos seus discípulos, deveria acompanhar também a nós, que deveríamos parar “a correria frenética que dita as nossas agendas”:

“Aprendamos a parar, a desligar o telemóvel, a contemplar a natureza, a regenerarmo-nos no diálogo com Deus.”

A compaixão nasce da contemplação

Mas o Papa recorda ainda, que “o Evangelho narra que Jesus e os discípulos não podem descansar como gostariam”, pois as pessoas provenientes dos lugares mais diversos reconhecem-nos. Neste ponto, move-se a compaixão”:

Aqui está o segundo aspeto: a compaixão que é o estilo de Deus, o estilo de Deus é: proximidade, compaixão e ternura. Quantas vezes no Evangelho, na Bíblia, encontramos esta frase: “teve compaixão dele”. Comovido, Jesus dedica-se ao povo e retoma o ensino. Parece uma contradição, mas na realidade não o é. De facto, só o coração que não se deixa levar pela pressa é capaz de se comover, isto é, de não se deixar levar por si mesmo e pelas coisas a fazer e de perceber os outros, as suas feridas, as suas necessidades. A compaixão nasce da contemplação.

Ecologia do coração

Assim – observou Francisco - caso aprendamos a descansar verdadeiramente, tornaremo-nos capazes da verdadeira compaixão:

Se cultivarmos o olhar contemplativo, levaremos em frente as nossas atividades sem a atitude voraz de quem quer possuir e consumir tudo; se permanecermos em contacto com o Senhor e não anestesiarmos a parte mais profunda de nós, as coisas a fazer não terão o poder de nos tirar o fôlego e de nos devorar. Temos necessidade - ouçam isto - temos necessidade de uma “ecologia do coração” que inclui descanso, contemplação e compaixão. Aproveitemos o tempo de verão para isso. Ajuda-nos bastante!

Ao concluir, o Santo Padre convidou os fiéis a dirigirem-se a Nossa Senhora, “que cultivou o silêncio, a oração e a contemplação, e move-se sempre em terna compaixão por nós, seus filhos.”

Vatican News

domingo, 11 de julho de 2021

Papa: nenhum doente fique só. Sistema de saúde gratuito e acessível a todos

 
 
Do Hospital Agostino Gemelli, onde recupera de uma cirurgia, o Papa Francisco rezou de modo especial por todos os enfermos e fez um apelo por um sistema de saúde acessível a todos. Da janela do décimo andar, recebeu o carinho dos fiéis - uma imagem que não se via desde 2005, quando no dia 13 de março S. João Paulo II pronunciou algumas palavras em público após uma traqueotomia.
 

Bianca Fraccalvieri - Cidade do Vaticano

“Estou feliz por poder manter o encontro dominical do Angelus, também aqui da Policlínica “Gemelli”. Agradeço a todos: senti muito a proximidade e o amparo das suas orações. Obrigado de coração!”

Um sentimento de gratidão marcou o Angelus deste domingo, realizado do Hospital Agostino Gemelli, onde o Papa Francisco está internado há uma semana, desde que se submeteu a uma cirurgia no intestino.

Da janela do seu apartamento no décimo andar da Policlínica, rodeado por crianças enfermas, o Papa acenou aos fiéis presentes na pequena praça que fica na entrada da estrutura e dali fez uma breve meditação sobre o Evangelho do dia, destacando de modo especial uma frase de Jesus aos discípulos: "curavam numerosos doentes, ungindo-os com óleo" (Mc 6,13).

"Este 'óleo' é certamente o sacramento da Unção dos enfermos, que dá conforto ao espírito e ao corpo. Mas este 'óleo' é também a escuta, a proximidade, o cuidado, a ternura de quem cuida da pessoa doente: é como uma carícia que faz sentir melhor, alivia a dor e soleva."

Para Francisco,  mais cedo ou mais tarde, todos necessitamos desta “unção” e todos podemos oferecê-la a alguém, com uma visita, um telefonema, uma mão estendida a quem necessita de ajuda. "Recordemos que no protocolo do juízo final Mateus, 25, uma das coisas que nos perguntarão será a proximidade aos doentes.

 

 Fiéis reunidos para rezarem com o Papa 

 

Sistema de saúde acessível a todos

Todavia, esta dimensão pessoal do cuidado deve ser alargada para uma dimensão social, em que todos os cidadãos possam usufruir de um sistema de saúde.

"Nestes dias de internamento no hospital, prosseguiu o Pontífice, experimentei quanto é importante um bom serviço de saúde gratuito, acessível a todos, como existe em Itália e em outros países. Um sistema de saúde gratuito, que garanta um bom serviço acessível a todos. Não se pode perder este bem precioso. É preciso mantê-lo! E para isso é necessário que todos se empenhem, porque serve a todos e pede a contribuição de todos."

O Santo Padre lamentou que às vezes, na Igreja, quando alguma instituição de saúde passa por problemas financeiros, inclusive por má gestão, o primeiro pensamento é vender a estrutura: "Mas a sua vocação na Igreja não é ter dinheiro, mas prestar um serviço e um serviço é sempre gratuito, não se esqueçam, salvar as instituições gratuitas".

Por fim, Francisco dirigiu uma palavra a quem trabalha em hospitais, pedindo orações pelos enfermos:

"Quero expressar o meu apreço e o meu encorajamento aos médicos e a todos os agentes de saúde e aos funcionários dos hospitais. E rezemos por todos os doentes, aqui estão alguns amigos crianças doentes. Porque sofrem as crianças? Porque sofrem as crianças é uma pergunta que toca no coração. Acompanhemo-las com a oração e rezemos por todos os doentes, especialmente por aqueles em condições mais difíceis: ninguém fique só, cada um possa receber a unção da escuta, da proximidade, da ternura e do cuidado. E é o que pedimos por intercessão de Maria, nossa Mãe, saúde dos enfermos."

 

VN

domingo, 4 de julho de 2021

O Papa: sem abertura à novidade e às surpresas de Deus a fé extingue-se

 

 O Papa no Angelus  (Vatican Media) 
 
É escandaloso que a imensidão de Deus se revele na pequenez da nossa carne, que o Filho de Deus seja o filho do carpinteiro, que a divindade esteja escondida na humanidade, que Deus habite no rosto, nas palavras, nos gestos de um simples homem. Eis o escândalo: a encarnação de Deus, a sua concretude, o seu "quotidiano", disse o Papa Francisco no Angelus deste domingo, XIV do Tempo comum

Raimundo de Lima - Vatican News

"Peçamos a Nossa Senhora, que acolheu o mistério de Deus na vida quitidiana de Nazaré, para ter olhos e corações livres de preconceitos e abertos à maravilha, às surpresas de Deus, à Sua presença humilde e escondida na vida quotidiana."

Foi a oração com a qual o Papa Francisco concluiu a alocução que precede o Angelus ao conduzir a oração mariana ao meio-dia deste domingo, XIV do Tempo Comum, dirigindo-se aos fiéis e peregrinos presentes na Praça de S. Pedro.

Incredulidade dos conterrâneos de Jesus

Comentando o Evangelho do dia (Mc 6,1-6), Francisco ressaltou que o mesmo nos fala da incredulidade dos conterrâneos de Jesus. Depois de pregar noutras aldeias da Galileia, Jesus voltou a Nazaré, onde tinha crescido com Maria e José; e, num sábado, começou a ensinar na sinagoga.

Muitos, ouvindo-o, interrogaran-se: "De onde lhe vem toda esta sabedoria? Não é o filho do carpinteiro e de Maria, isto é, dos nossos vizinhos que conhecemos bem?", acrescentou o Santo Padre, apresentando esta página do Evangelho que traz a visita de Jesus a Nazaré.

Nenhum profeta é bem recebido na sua própria terra

O Pontífice recordou que diante desta reação, Jesus afirma uma verdade que também se tornou parte da sabedoria popular: "Um profeta não é desprezado excepto na sua própria pátria, entre os seus parentes e na sua própria casa".

Neste ponto, Francisco deteve-se na atitude dos conterrâneos de Jesus:

"Podemos dizer que eles conhecem Jesus, mas não o reconhecem. Efetivamente, há diferença entre conhecer e reconhecer: podemos saber várias coisas sobre uma pessoa, formar uma ideia, confiar no que os outros dizem sobre ela, talvez de vez em quando encontrá-la no bairro, mas tudo isto não é suficiente. Trata-se de um conhecer superficial, que não reconhece a unicidade dessa pessoa. É um risco que todos nós corremos: achamos que sabemos tanto sobre uma pessoa, rotulamo-la e a restringimos nos nossos preconceitos."

Rejeição à novidade de Jesus

Da mesma forma, acrescentou o Papa, os conterrâneos de Jesus conhecem-no há trinta anos e pensam que sabem tudo; na realidade, nunca se deram conta de quem é verdadeiramente. Eles detêm-se na exterioridade e rejeitam a novidade de Jesus.

Quando deixamos a comodidade do hábito e a ditadura dos preconceitos prevalecer, observou o Santo Padre, é difícil abrirmo-nos à novidade e deixarmo-nos surpreender. Muitas vezes acabamos a procurar confirmação das nossas ideias e esquemas na vida, nas nossas experiências e até mesmo nas pessoas, para nunca ter que fazer o esforço de mudar.

Abrirmo-nos à novidade e surpresas de Deus

"Mas sem abertura à novidade e às surpresas de Deus, sem admiração, a fé se torna uma ladainha cansada que lentamente se extingue", enfatizou.

Afinal, por que os conterrâneos de Jesus não O reconhecem e acreditam n’Ele? Qual é o motivo? – perguntou o Papa. "Podemos dizer, em poucas palavras, que não aceitam o escândalo da Encarnação", respondeu Francisco.

"É escandaloso que a imensidão de Deus se revele na pequenez de nossa carne, que o Filho de Deus seja o filho do carpinteiro, que a divindade esteja escondida na humanidade, que Deus habite no rosto, nas palavras, nos gestos de um simples homem."

O escândalo da encarnação de Deus

Eis o escândalo: a encarnação de Deus, a sua concretude,o  seu "quotidiano". Na realidade, é mais cómodo um deus abstrato e distante, que não se intromete nas situações e que aceita uma fé distante da vida, dos problemas, da sociedade. Ou mesmo gostamos de acreditar num deus "com efeitos especiais", que só faz coisas excecionais e dá  sempre grandes emoções, disse ainda Francisco.

"Ao invés, Deus encarnou-se: humilde, terno, escondido, faz.se próximo de nós habitando a normalidade da nossa vida quotidiana. E assim, como os conterrâneos de Jesus, corremos o risco que, quando passa, não o reconhecemos, aliás, escandalizamo-nos por Ele."

Vatican News