domingo, 27 de novembro de 2022

O Papa e o Advento: Deus esconde-se nas situações mais comuns da nossa vida

 
 
 
Neste domingo, começa o Advento, tempo litúrgico que nos prepara para o Natal. Francisco recordou no Angelus a "bela promessa que nos introduz no tempo do Advento: «Virá o teu Senhor». Este é o fundamento da nossa esperança, é o que nos sustenta também nos momentos mais difíceis e dolorosos da nossa vida".
 

Mariangela Jaguraba - Vatican News

O Papa Francisco rezou a oração mariana do Angelus, deste domingo (27/11), com os fiéis e peregrinos reunidos na Praça de São Pedro.

 

Na alocução que precedeu a oração, o Pontífice recordou a "bela promessa que nos introduz no tempo do Advento: «Virá o teu Senhor».

Este é o fundamento da nossa esperança, é o que nos sustenta também nos momentos mais difíceis e dolorosos da nossa vida: Deus vem. Nunca nos esqueçamos disso! O Senhor vem sempre, visita-nos, faz-se próximo, e voltará no fim dos tempos para nos acolher no seu abraço.

O Senhor inspira as nossas ações

A seguir, o Papa fez as seguintes perguntas: "Como vem o Senhor? Como reconhecê-lo e acolhê-lo?" Primeira pergunta: como vem o Senhor?

Segundo Francisco, "muitas vezes ouvimos dizer que o Senhor está presente no nosso caminho, que nos acompanha e nos fala. Mas talvez, distraídos como estamos por tantas coisas, esta verdade permanece para nós apenas teórica, ou imaginamos que o Senhor vem de maneira sensacional, talvez por meio de algum sinal prodigioso. Jesus diz que acontecerá "como nos dias de Noé". E o que faziam nos dias de Noé? Simplesmente as coisas normais e quotidianas da vida: «Comiam e bebiam, casavam-se e davam-se em casamento»".

Levemos em consideração isso: Deus está escondido na nossa vida, está sempre presente, está escondido nas situações mais comuns e ordinárias da nossa vida. Não vem em eventos extraordinários, mas nas coisas do dia-a-dia. O Senhor vem nas coisas do dia-a-dia, porque Ele está ali, manifesta-se nas coisas de todos os dias. Ele está ali, no nosso trabalho quotidiano, num encontro casual, no rosto de uma pessoa necessitada, mesmo quando enfrentamos dias que parecem cinzentos e monótonos, o Senhor está ali, chama- fala-nos e inspira as nossas ações.

Perceber a presença de Deus na vida cotidiana

Segunda pergunta: como reconhecer e acolher o Senhor? De acordo com o Papa, "devemos estar acordados, atentos, vigilantes. Jesus adverte-nos: existe o perigo de não percebermos a sua vinda e estar despreparados para a sua visita".

Francisco disse que recordou "outras vezes o que Santo Agostinho dizia: "Temo o Senhor que passa", ou seja, temo que Ele passe e eu não o reconheça! De facto, sobre aquelas pessoas do tempo de Noé, Jesus diz que elas comiam e bebiam «e nada perceberam, até que veio o dilúvio, e arrastou todos»".

Prestemos atenção nisto: não perceberam nada! Estavam ocupadas com suas coisas e não perceberam que o dilúvio estava para vir. De facto, Jesus diz que, quando Ele vier, "dois homens estarão a trabalhar no campo: um será levado e o outro deixado". Qual é a diferença? Em que sentido? Simplesmente que um estava vigilante, esperava, capaz de perceber a presença de Deus na vida quotidiana; o outro, por outro lado, estava distraído, "sem compromisso", como se fosse nada, e não percebeu nada.

Deixar-se chacoalhar pelo torpor

"Neste Tempo do Advento deixemo-nos chacoalhar pelo nosso torpor e despertemo-nos do sono", disse o Papa, convidando-nos a fazer as seguintes perguntas: "Estou consciente do que vivo? Estou atento? Estou acordado? Procuro reconhecer a presença de Deus nas situações quotidianas ou estou distraído e um pouco esmagado pelas coisas?"

"Se não percebermos a sua vinda hoje, também estaremos despreparados quando ele vier no fim dos tempos. Irmãos e irmãs, permaneçamos vigilantes! Esperando que o Senhor venha, aproxime-se de nós, porque Ele está aqui, espera. Prestemos atenção! Que a Virgem Santa, Mulher da expetativa, que percebeu a passagem de Deus na vida humilde e escondida de Nazaré e o acolheu no seu ventre, nos ajude neste caminho de estar atentos à espera do Senhor que está no meio de nós e passa", concluiu Francisco.

Vatican News

domingo, 20 de novembro de 2022

Papa em Asti: Jesus, Rei que nos abraça, mesmo com as nossas misérias

 

 

Na homilia da missa na Catedral de Asti, pela Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, o Papa enfatizou que da cruz Jesus abraça todos, com pobrezas, fragilidades e misérias. Entretanto, pede-nos que o chamemos pelo nome e que sujemos as nossas mãos com ele, não como meros espetadores, mas "envolvidos", com coragem de olhar para nós mesmos e pelos sofrimentos do mundo, "fazendo-nos servos para reinar com Ele".

 

Andressa Collet - Vatican News

O abraço do Papa à comunidade de Asti, no norte da Itália, veio na manhã de domingo (20) na Catedral de Nossa Senhora da Assunção pela Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo. Após percorrer a cidade e saudar de perto as pessoas a bordo do papa-móvel, Francisco deu início ao seu segundo e último dia na região do Piemonte, terras em que o seu pai emigrou para a Argentina e onde veio "reencontrar o sabor das raízes", disse o Pontífice em homilia, ao fazer referência ao Evangelho de Lucas 23, 35-43 que "nos leva às raízes da fé" encontradas no "terreno árido do Calvário".

O nosso Rei de braços abertos

O Papa, então, convidou a fixar "o nosso olhar n’Ele, no Crucificado", despido na cruz, que ganhou a falsa imagem de realeza através de um letreiro na cruz. Mas, observando Jesus, alertou Francisco, "inverte-se a ideia que temos de um rei", "vemos que é completamente diferente. Não está sentado num trono confortável" e "comporta-Se como servo cravado na cruz pelos poderosos", "despojado de tudo, mas rico de amor":

“Do trono da cruz, já não ensina as multidões com a palavra, nem levanta a mão para ensinar; faz mais: não aponta o dedo contra ninguém, mas abre os braços a todos. Assim Se manifesta o nosso Rei: de braços abertos – a brasa aduerte.”

E só entrando no seu abraço, continuou Francisco, é que compreendemos que Deus Se deixou levar até o paradoxo da cruz para abraçar tudo em nós: a nossa morte, o nosso sofrimento, as nossas pobrezas, as nossas fragilidades.

"Eis o nosso Rei, Rei do universo, porque atravessou os confins mais remotos do humano, entrou nos buracos negros do ódio e do abandono para iluminar cada vida e abraçar toda a realidade. Irmãos, irmãs, tal é o Rei que hoje festejamos! Não é fácil de entender, mas é o nosso Rei."

Esse é o modelo a seguir e a celebrar, acrescentou o Papa, por isso o convite para, "com frequência", colocarmo-nos diante do Crucificado e dar a possibilidade de "nos deixarmos amar por Ele":

“Mas Senhor, é verdade? Com as minhas misérias, amas-me assim? Cada um neste momento pense na sua própria pobreza: 'Mas, amas-me com estas pobrezas espirituais que eu tenho, com estas limitações?' E Ele sorri e faz-nos perceber que nos ama e deu a Sua vida por mim. Pensemos um pouco sobre as nossas limitações, mesmo as coisas boas, e Ele ama-nos como nós somos, como somos agora.”

"E então compreendemos que não temos um deus desconhecido, lá em cima nos céus, poderoso e distante, não; um Deus próximo, a proximidade é o estilo de Deus: a proximidade, com ternura e misericórdia. Este é o estilo de Deus. Não tem outro estilo. Perto, misericordioso e terno. Terno e compassivo, cujos braços abertos consolam e acariciam. Eis o nosso Rei!"

O contágio letal da indiferença

Depois de termos contemplado Jesus na cruz, questionou o Papa, o que mais podemos fazer? Ser apenas um espetador - aquela grande maioria curiosa e indiferente que só observa e julga ao "assistir ao espetáculo cruento do fim inglorioso de Cristo"; ou quem se aventura e se envolve. O primeiro grupo, alertou o Pontífice, faz parte de uma "onda do mal", que "é contagiosa", feito uma "doença contagiosa" que acaba tornando-nos "cristãos de fachada, que dizem acreditar em Deus e querer a paz, mas não rezam nem cuidam do próximo".

É o contágio letal da indiferença. Uma doença feia é a indiferença, sabe? 'Isto não cabe a mim, não cabe a mim...' indiferença para com Jesus e indiferença também para com os doentes, para com os pobres, para com os miseráveis da terra. Eu gosto de perguntar às pessoas, e peço a cada um de vós; eu sei que cada um de vocês dá esmola aos pobres, e eu pergunto-vos: 'Quando dás esmola aos pobres, olhas nos olhos deles? És capaz de olhar nos olhos deles? Daquele pobre homem ou mulher que te pede esmola? Quando dás  esmola aos pobres, jogas a moeda ao chão ou tocas na mão deles? És capaz de tocar uma miséria humana?' Cada pessoa então faz a resposta hoje. Aquelas pessoas eram indiferentes. Aquelas pessoas falam de Jesus, mas não se sintonizam com Jesus. E esse é o contágio letal da indiferença: que cria distância com a miséria.

A onda do bem dos envolvidos

Entretanto, entre muitos espetadores no território do Calvário, continuou o Papa, há quem se aventura e se envolve. E o Evangelho fala "do bom ladrão para nos convidar a vencer o mal, deixando de ser espetadores. E de onde havemos de começar? Da confidência, de chamar a Deus pelo nome", indicou Francisco, sem maquilhagens:

"Por favor, não façam a espiritualidade de maquilhagem: ela é entediante. Diante de Deus: sabão e água, somente. Sem maquilhagem, a alma como ela é. E dali vem a salvação."

“Irmãos, irmãs, hoje o nosso Rei olha-nos da cruz a brasa aduerte. Cabe a nós escolher, sermos espetadores ou envolvidos. Vemos as crises de hoje, o declínio da fé, a falta de participação... E o que fazemos? Limitamo-nos a fazer teorias, a criticar, ou arregaçamos as mangas, comprometemo-nos na vida, passamos do «se» das desculpas ao «sim» da oração e do serviço? Todos pensamos saber o que está errado na sociedade, no mundo, até na Igreja, mas depois… fazemos alguma coisa? Metemos as mãos na massa, como o nosso Deus pregado no madeiro, ou ficamos a olhar com as mãos nos bolsos?”

 

Vatican News

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

O Papa: não ter medo da desolação, mas nela encontrar o coração de Cristo

 

 
Na Audiência Geral desta quarta-feira, o Papa retomou as catequeses sobre o discernimento e falou sobre a desolação que "pode ser ocasião de crescimento. A desolação é também um convite à gratuidade, a não agir sempre e unicamente em vista de uma gratificação emocional. Estar desolados oferece-nos a possibilidade de crescer, de começar uma relação mais madura, mais bela, com o Senhor e com os entes queridos, uma relação que não se reduza a uma mera troca de dar e receber". 
 

Mariangela Jaguraba - Vatican News

O Papa Francisco retomou as catequeses sobre o discernimento na Audiência Geral, desta quarta-feira (16/11), realizada na Praça São Pedro. "Por que estamos desolados" foi o tema deste encontro semanal do Pontífice com os fiéis.

O Santo Padre recordou a importância de "ler o que se move dentro de nós, para não tomar decisões apressadas, na onda da emoção do momento, para depois se arrepender, quando já é demasiado tarde. Neste sentido, o estado espiritual a que chamamos desolação, quando no coração tudo está escuro, triste, pode ser ocasião de crescimento".

Segundo o Papa, "a desolação provoca uma “trepidação da alma”, mantém-nos alertas, favorece a vigilância e a humildade, protegendo-nos contra os ventos do capricho. São condições indispensáveis para o progresso na vida e, portanto, inclusive na vida espiritual".

Inquietação, ímpeto para dar uma reviravolta na própria vida

"Uma serenidade perfeita, mas “asséptica”, sem sentimento, quando se torna o critério de escolhas e comportamentos, torna-nos desumanos", disse Francisco, acrescentando:

Não podemos deixar de prestar atenção aos sentimentos, somos humanos e o sentimento é uma parte da nossa humanidade, e sem entender os sentimentos seremos desumanos, sem viver os sentimentos, seremos indiferentes ao sofrimento dos outros e incapazes de aceitar o nosso. Sem considerar que esta “serenidade perfeita” não se alcança por este caminho da indiferença.

“Distância asséptica: eu não me misturo nas coisas, tomo distância. Isso não é vida, isso é como se vivêssemos num laboratório, fechados para não apanhar um micróbio, uma doença. Para muitos santos e santas, a inquietação foi um ímpeto decisivo para dar uma reviravolta na própria vida. Esta serenidade artificial não é boa, mas sim uma inquietação saudável. Um coração inquieto, que busca o caminho.”

Como "é o caso, por exemplo, de Agostinho de Hipona, Edith Stein, José Benedito Cottolengo e Charles de Foucauld", frisou o Papa, afirmando que "as escolhas importantes têm um preço que a vida apresenta, um preço acessível a todos. As escolhas importantes não vêm da lotaria, elas têm um preço e tens de pagar aquele preço. É um preço que pagas com o coração, um preço da decisão, um preço a ser levado adiante, com um pouco de esforço, mas não é grátis. É um preço que está ao alcance de todos. Todos temos que pagar esta decisão para sair do estado de indiferença que nos põe para baixo".

A desolação é também um convite à gratuidade

A desolação é também um convite à gratuidade, a não agir sempre e unicamente em vista de uma gratificação emocional. Estar desolados oferece-nos a possibilidade de crescer, de começar uma relação mais madura, mais bela, com o Senhor e com os entes queridos, uma relação que não se reduza a uma mera troca de dar e receber. Pensemos na nossa infância. Quando se é criança, procura-se com frequência os pais para obter algo deles, um brinquedo, dinheiro para comprar um sorvete, uma autorização. E assim os procuramos não por eles mesmos, mas por um interesse. No entanto, o maior dom são eles, os pais, e compreendemos isso na medida em que crescemos.

Segundo o Papa, "até muitas das nossas orações são um pouco desse tipo, são pedidos de favores dirigidos ao Senhor, sem um verdadeiro interesse por Ele. O Evangelho observa que Jesus vivia frequentemente circundado por muitas pessoas que o procuravam para obter algo, curas, ajudas materiais, mas não simplesmente para estar com Ele. Era pressionado pelas multidões e, contudo, estava sozinho. Alguns santos, e até certos artistas, meditaram sobre esta condição de Jesus. Poderia parecer estranho, irreal, perguntar ao Senhor: “Como estás?” No entanto, é um modo muito bonito de entrar numa relação verdadeira, sincera, com a sua humanidade, com o seu sofrimento, até com a sua singular solidão. Com Ele, que quis partilhar até ao fundo a sua vida connosco".

Levar adiante a desolação com perseverança

Segundo o Papa, faz-nos bem "aprender a estar com Ele, estar com o Senhor, aprender a estar com Senhor sem outro objetivo, exatamente como nos acontece com as pessoas de quem gostamos: desejamos conhecê-las cada vez mais, porque é bom estar com elas".

Francisco disse que "a vida espiritual não é uma técnica à nossa disposição, não é um programa de “bem-estar” interior que nos compete planificar. Não! A vida espiritual é a relação com o Vivente, com Deus, o Vivente, irredutível às nossas categorias". "Quem reza observa que os resultados são imprevisíveis", frisou o Pontífice, convidando "a não ter medo da desolação, mas levá-la adiante com perseverança, não fugir, e na desolação procurar encontrar o coração de Cristo, encontrar o Senhor, e a resposta chega sempre".

"Portanto, diante das dificuldades nunca devemos desanimar, mas enfrentar a provação com decisão, com a ajuda da graça de Deus que nunca nos falta. E se ouvirmos dentro de nós uma voz insistente, que nos quer distrair da oração, aprendamos a desmascará-la como a voz do tentador; e não nos deixemos impressionar: façamos simplesmente o contrário do que ela nos diz", concluiu o Papa.

Vatican News

domingo, 13 de novembro de 2022

Papa: cuidado com os falsos "messias", o ser humano é o verdadeiro templo de Deus

 
 Papa na missa por ocasião do Dia Mundial dos Pobres 
 
No Dia Mundial dos Pobres, Francisco celebrou a missa na Basílica de São Pedro com a participação de milhares de pessoas em situação de vulnerabilidade. Na homilia, exortou os fiéis a romperem a "surdez interior" que impede de ouvir o grito de sofrimento dos mais frágeis. E convidou a refletir sobre o que fazer diante da III Guerra Mundial.
 

Bianca Fraccalvieri – Vatican News

O ser humano é o verdadeiro templo de Deus: foi o que recordou o Papa Francisco ao celebrar a missa na Basílica de São Pedro neste Dia Mundial dos Pobres.

O Pontífice inspirou a sua homilia no Evangelho deste XXXIII Domingo do Tempo Comum, em que Jesus faz duas exortações: não vos deixeis enganar e dai testemunho.

Jesus quer livrar-nos da tentação de ler os factos mais dramáticos de modo supersticioso ou catastrófico, como se estivéssemos já perto do fim do mundo não valendo a pena empenharmo-nos em algo de bom. Durante as crises, nunca faltam magos, gurus, horóscopos e teorias fantasiosas propostas por qualquer “messias” da última hora. "E muitos cristãos procuram o horóscopo como se fosse a voz de Deus", lamentou. Por sua vez, o discípulo do Senhor não cede ao desânimo nem mesmo nas situações mais difíceis, porque o seu Deus é o Deus da ressurreição e da esperança.

A arte tipicamente cristã: reagir ao mal com o bem

Assim, a segunda exortação é justamente esta: Tereis ocasião de dar testemunho. E Francisco acentuou a palavra “ocasião”, ressaltando que é uma “arte tipicamente cristã” não ficar refém daquilo que acontece, mas aproveitar a oportunidade de construir mesmo a partir de situações negativas. "O cristão não permanece vítima daquilo que acontece", recordou o Papa. Portanto, situações de prova, de perda de controle, de insegurança são ocasiões para testemunhar o Evangelho. "Também eu, hoje, faço a mim esta pergunta: o que está dizer-nos o Senhor diante desta III Guerra Mundial?"

A crise, explicou ainda Francisco, é abertura, enquanto o mau espírito trabalha para que a crise se torne conflito. "O conflito é sempre fechamento, sem horizonte e sem saída. Não! Vivamos a crise como pessoas humanas, como cristãos, sem as transformar em conflito porque toda a crise é uma possibilidade e oferece ocasião de crescimento."

O Papa convidou cada um a interrogar-se: "Diante desta III Guerra Mundial tão cruel, diante da fome de tantas crianças, de tantas pessoas: eu posso desperdiçar, desperdiçar dinheiro, desperdiçar a minha vida, desperdiçar o sentido da minha vida sem tomar coragem e ir em frente?"

O sofrimento do povo ucraniano

E este é o convite que ressoa neste Dia Mundial dos Pobres, para romper esta surdez interior que nos impede de ouvir o grito de sofrimento, sufocado, dos mais frágeis.

Também hoje vivemos em sociedades feridas e assistimos, tal como nos disse o Evangelho, a cenários de violência, "é só pensar na crueldade que está a sofrer o povo ucraniano", de injustiça e de perseguição; há a crise gerada pelas alterações climáticas e pela pandemia; ampliam-se os conflitos, estamos diante da “calamidade da guerra”; há desemprego e migração forçada. E os pobres são os mais penalizados.

“Mas, se o nosso coração estiver blindado e indiferente, não conseguiremos ouvir o seu flébil grito de dor, chorar com eles e por eles, ver quanta solidão e angústia se escondem mesmo nos cantos esquecidos das nossas cidades, vê-se ali tanta miséria, tanta dor e tanta pobreza descartada.”

Não dar ouvidos aos falsos "messias"

Portanto, prosseguiu o Papa, façamos nosso o convite forte e claro do Evangelho de não nos deixarmos enganar. Não vamos dar ouvidos aos profetas da desgraça, às sirenes do populismo, aos falsos "messias" que, em nome do lucro, proclamam receitas úteis apenas para aumentar a riqueza de poucos.

Ao contrário, vamos dar testemunho: aproveitar a ocasião para testemunhar o Evangelho da alegria e construir um mundo mais fraterno; empenhando-nos em prol da justiça, da legalidade e da paz, permanecendo ao lado dos mais frágeis. “Não fujamos para nos defender da história, mas lutemos para dar a esta história que estamos a viver um rosto diferente.”

A força vem da confiança em Deus. Abrindo o nosso coração a Ele, aumentará em nós a capacidade de amar e "este é o caminho: crescer no amor". Deixemo-nos interrogar: como cristãos, que atitude tomar diante desta civilização que descarta os pobres, os velhos e os nascituros? Francisco recordou uma tradição italiana, na ceia de Natal, de reservar um lugar vazio à mesa para o Senhor que poderá bater à porta. E questionou: "O seu coração tem sempre um lugar vazio para aquela gente, ou estamos tão atarefados com os amigos, os eventos sociais, as obrigações? Nunca temos um lugar vazio para aquelas pessoas. Amados por Ele, decidamo-nos amar os filhos mais descartados. Ele identifica-se com o pobre."

“Não podemos ficar – como aqueles de quem fala o Evangelho – a admirar as belas pedras do templo, sem reconhecer o verdadeiro templo de Deus, o ser humano, o homem e a mulher, especialmente o pobre, em cujo rosto, em cuja história, em cujas feridas está Jesus. Foi Ele que o disse… Nunca o esqueçamos!”

Vatican News

Angelus: com Jesus não há nada a temer, vamos perseverar na construção do bem

 
 Angelus - 2022-11-13
 
A perseverança foi o tema da alocução do Papa Francisco antes de rezar o Angelus dominical neste XXXIII Domingo do Tempo Comum: "A perseverança é o reflexo no mundo do amor de Deus, porque o amor de Deus é fiel, nunca muda."
 

Bianca Fraccalvieri – Vatican News

Depois da missa celebrada na Basílica Vaticana, o Papa rezou o Angelus com os fiéis e peregrinos reunidos na Praça de São Pedro.

Na sua alocução, comentou o Evangelho deste domingo, que nos leva a Jerusalém, ao lugar mais santo: o templo. Jesus adverte que tudo será destruído, que não ficará pedra sobre pedra, mas Francisco concentra-se na frase final do trecho de Lucas para introduzir o tema da perseverança. De facto, Jesus diz: “É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida!”

Jesus pede para persistir no que realmente importa e eis o significado da perseverança: construir o bem a cada dia.

“Perseverar é permanecer constantes no bem, especialmente quando a realidade circundante impele a fazer outra coisa.”

O Papa fez exemplos da vida concreta, com situações que acontecem connosco ou pessoas próximas de nós, que vão desde adiar o momento de oração até se deixarem influenciar por pessoas que tiram vantagem de tudo. Perseverar, por outro lado, é permanecer no bem. Francisco então convida-nos a refletir:

“Como está a minha perseverança? Sou constante ou vivo a fé, a justiça e a caridade de acordo com os momentos: se dá vontade rezo, se me convém sou correto, disponível e prestativo, enquanto, se estou insatisfeito, se ninguém me agradece, deixo de sê-lo? Em suma, a minha oração e o meu serviço dependem das circunstâncias ou de um coração firme no Senhor?”

Ao invés, Jesus recorda-nos que se perseverarmos não teremos nada a temer, mesmo nos tristes momentos da vida, mesmo diante do mal ao nosso redor, porque permanecemos alicerçados no bem.

“A perseverança é o reflexo no mundo do amor de Deus, porque o amor de Deus é fiel, nunca muda. Que Nossa Senhora, serva do Senhor perseverante na oração, fortaleça a nossa constância.”

Vatican News

terça-feira, 1 de novembro de 2022

O Papa: a paz tem que ser construída. Nunca é violenta, nunca está armada

 
 
Francisco disse que "a paz de Jesus é muito diferente do que imaginamos. Todos desejamos a paz, mas muitas vezes o que queremos é estar em paz, sermos deixados em paz, não ter problemas, mas tranquilidade. Na verdade, a paz tem que ser construída e, como qualquer construção, ela requer compromisso, colaboração e paciência"
 

Mariangela Jaguraba/Silvonei José – Vatican News

O Papa Francisco conduziu a oração mariana do Angelus na Solenidade de Todos os Santos celebrada, no Vaticano, em Itália, nesta terça-feira (1º/11).       

Na alocução que precedeu a oração, Francisco disse que podemos ter uma impressão enganosa dessa Solenidade, pensado que estamos a celebrar os irmãos e irmãs que "na vida foram perfeitos, sempre lineares, precisos e engomados".

A paz tem que ser construída

"Em vez disso, o Evangelho de hoje desmente esta visão estereotipada, esta "santidade perfeita de imagem". De facto, as bem-aventuranças de Jesus, que são a carteira de identidade dos santos, mostram totalmente o contrário: falam de uma vida contracorrente, de uma vida revolucionária, os santos são os verdadeiros revolucionários", disse o Papa, tomando como exemplo uma bem-aventurança muito atual: "Bem-aventurados os pacificadores". "Vemos como a paz de Jesus é muito diferente do que imaginamos. Todos desejamos a paz, mas muitas vezes o que queremos não é a paz, mas estar em paz, sermos deixados em paz, não ter problemas, mas tranquilidade, Jesus, por outro lado, não chama bem-aventurados aos tranquilos, aos que estão em paz, mas aos que fazem a paz e lutam para fazer a paz, os construtores, os pacificadores", sublinhou Francisco, acrescentando:

Na verdade, a paz tem que ser construída e, como qualquer construção, ela requer compromisso, colaboração, paciência. Gostaríamos que a paz chovesse do alto, ao invés disso a Bíblia fala de "semente da paz", porque ela germina do solo da vida, da semente do nosso coração; cresce em silêncio, dia após dia, através de obras de justiça e obras de misericórdia, como nos mostram as testemunhas luminosas que hoje festejamos. Mais ainda, somos levados a acreditar que a paz vem com a força e o poder: para Jesus é o oposto. A Sua vida e a dos santos dizem-nos que a semente da paz, para crescer e dar frutos, deve primeiro morrer. A paz não é alcançada conquistando ou derrotando alguém, nunca é violenta, nunca está armada.

O Papa disse ainda que viu no programa italiano "Sua Immagine" os muitos santos e santas que lutaram, que fizeram a paz com o trabalho, dando a própria vida, oferecendo a vida.

Desmilitarizar o campo do coração

"Como então alguém se torna um agente de paz? Primeiramente, é necessário desarmar o coração", disse ainda o Papa.

Sim, porque todos nós estamos equipados com pensamentos agressivos, um contra o outro, palavras afiadas, e pensamos em defender-nos com os arames farpados da lamentação e com os muros de concreto da indiferença. Entre lamentação e indiferença defendemo-nos e isto não é paz. Isto é guerra. A semente da paz pede para desmilitarizar o campo do coração. Como? Abrindo-nos a Jesus, que é "a nossa paz"; permanecendo diante da sua cruz, que é a cátedra da paz; recebendo d’Ele, na Confissão, "o perdão e a paz". É aqui que começamos, porque ser agentes da paz, ser santos, não é capacidade nossa, são dons, é um dom seu, é graça.

O Pontífice convidou-nos a olhar para dentro de nós e interrogármo-nos: "Somos construtores de paz? Ali onde vivemos, estudamos e trabalhamos, levamos tensão, palavras que ferem, conversas que envenenam, polémicas que dividem? Ou abrimos o caminho para a paz: perdoamos aqueles que nos ofenderam, cuidamos daqueles que estão à margem, curamos alguma injustiça ajudando aqueles que têm menos? Isto chama-se construir a paz", reiterou.

Aquele que ama a todos e não fere ninguém vence

"Vale a pena viver assim? Não é ser um perdedor?", perguntou ainda Francisco.

É Jesus quem nos dá a resposta: os que promovem a paz "serão chamados filhos de Deus": no mundo eles parecem estar fora de lugar, porque não cedem à lógica do poder e do prevalecer. No céu serão os mais próximos de Deus, os mais semelhantes a Ele. Mas, na realidade, também aqui aquele que prevarica permanece de mãos vazias, enquanto aquele que ama a todos e não fere ninguém vence: como diz o Salmo, "o homem de paz terá uma descendência".

O Papa concluiu, pedindo à Virgem Maria, Rainha de todos os santos, para que "nos ajude a sermos construtores da paz na vida de cada dia".

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